Não foi por amor: a necessidade de compreensão e de investigação do feminicídio sob a perspectiva de gênero

  • Karen Damian Pacheco Pinto Ministério Público de Santa Catarina
Palavras-chave: Feminicídio, Investigação, Diretrizes nacionais, Perspectiva de gênero

Resumo

O feminicídio, expressão máxima da violência de gênero, apresenta alicerces históricos e sociais pautados na construção de relações assimétricas de poder. Partindo-se dessa premissa, o presente artigo expõe, com base nas Diretrizes Nacionais aprovadas pelo Brasil, a necessidade de que a investigação do feminicídio seja concebida sob a perspectiva de gênero, a qual deve permear, de igual modo, as demais fases do processo. Busca-se, pela análise de inquéritos policiais referentes a mortes intencionais de mulheres ocorridas entre os anos de 2017 e 2018 no Oeste catarinense, verificar se os parâmetros propostos pelo aludido documento foram observados durante a investigação. Desse modo, salienta-se, com fulcro em um estudo comparativo, a viabilidade de aperfeiçoamento de alguns pontos da investigação, refletindo-se, ainda, acerca da imprescindibilidade de modificação social para alcançar a redução dos crimes de feminicídio. Isso porque, em que pesem os avanços jurídicos nesse campo, ainda há a presença da culpabilização da vítima e a tentativa de justificação dos delitos por meio de pretensa paixão.

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Publicado
2021-05-24
Como Citar
DAMIAN PACHECO PINTO, K. Não foi por amor: a necessidade de compreensão e de investigação do feminicídio sob a perspectiva de gênero. Atuação: Revista Jurídica do Ministério Público Catarinense, v. 16, n. 34, p. 159-191, 24 maio 2021.
Seção
Dossiê